O post de hoje no Traduzindo a Dublagem volta a abordar um assunto que já mencionei em um post anterior, “O tradutor para dublagem escolhe o que vai traduzir?” No post em questão, falei sobre como tradutor costuma ter o seu perfil, e no de hoje vou retornar um pouco a essa questão e trazer novas reflexões acerca disso, não só na tradução para dublagem, como na tradução como um todo. Ah, e caso você não tenha conferido o post que mencionei anteriormente, é só clicar aqui! Pronto? Vamos lá! 😉
Algo muito curioso que comecei a reparar no mundo editorial ao se falar dos tradutores atuantes na área é a questão do perfil tradutório. Em diversas palestras que assisti ao longo dos anos, os editores costumam mencionar que há tradutores em suas equipes que se adequam a certos estilos e a certos gêneros.
Se pararmos pra pensar, isso faz todo sentido e é extremamente produtivo para ambas as partes. O tradutor trabalha com assuntos que lhes são prazerosos e amigáveis, e todos os demais profissionais que atuarão posteriormente no texto traduzido não terão grandes problemas, pois esperam que o tradutor tenha feito um bom trabalho. A lógica de se ter tradutores bons e especializados em certos temas e gêneros é excelente, mas, ao mesmo tempo, há questões que precisam ser levadas em consideração.
Pessoalmente, acredito que a primeira delas é o tradutor saber exatamente quais são os assuntos de que mais gosta: esportes em geral? Medicina? Direito? Culinária? Ficção científica e fantasia? Mitologias em geral? Cultura pop? São tantos temas possíveis de lidar em uma tradução que pode levar um certo tempo até esse profissional ter plena noção de tudo que gosta e que acredita ter conhecimento suficiente para poder realizar uma tradução de qualidade. Será que, mesmo gostando do tema que está traduzindo, ele tem fontes confiáveis para poder validar seus questionamentos? Afinal, gostar muito de um assunto, não necessariamente torna esse profissional um verdadeiro especialista, logo, a boa e velha pesquisa é fundamental. Sempre.
A segunda questão é que não necessariamente o que o tradutor consome no dia a dia será um prazer na hora da tradução. Ele pode amar séries de direito, mas será que toparia ficar horas procurando todos os termos do ramo jurídico para realizar uma tradução adequada? Uma coisa é consumir o produto pronto, outra completamente diferente é analisar e dissecar a produção de cima a baixo, em busca de termos que ele, na verdade, desconhece.
A busca pelo autoconhecimento dos gostos pessoais e preferências é constante, e pode levar alguns anos até o tradutor ter uma boa noção dos assuntos que se sente confortável para realizar um trabalho de qualidade. Algo que aconselho aos iniciantes na área da tradução para dublagem, por exemplo, é estar aberto a traduzir um pouco de tudo, para não só descobrir quais são os gêneros e temáticas que mais agradam, como também os que não agradam.
Trazendo agora a pauta para o mundo da tradução audiovisual, pela minha experiência e relacionamento com alguns estúdios, essa questão do perfil tradutório não é tão estabelecida e pregada como vejo no mundo editorial. Não quer dizer que não aconteça, mas são poucas casas de dublagem que parecem realizar o perfil de um tradutor recém-chegado na equipe.
Como já citei em outro post, a rotina dos estúdios é muito acelerada e produções diversas podem chegar no mesmo dia, então um tradutor precisa ser alocado para uma produção assim que ela chega. Talvez por conta desse eterno corre-corre fique difícil para os profissionais da parte da produção dos estúdios conseguirem tirar um tempo para realmente traçarem um perfil detalhado dos tradutores. No entanto, esse feedback acaba vindo dos diretores de dublagem, pois, ao lidarem com tradutores diferentes e com estilos diversos de tradução na hora das gravações, eles começam a perceber qual tradutor leva mais jeito para determinado tipo de produção.
A verdade é que o mundo do audiovisual é muuuuuito vasto e nunca cansa de nos impressionar com as temáticas abordadas e, principalmente, com as dificuldades que os tradutores precisam lidar para realizar um bom trabalho. É um ramo em que se espera que esses profissionais da língua consigam fazer um pouquinho de tudo, justamente por conta dessa grande gama de temas. Assim sendo, é um ofício que sempre nos empurra para darmos o nosso melhor e que, a cada produção entregue, terminamos mais sábios do que quando a começamos.
Como sempre, vale lembrar que os estúdios têm posturas muito próprias e se relacionam com suas equipes de tradução das mais variadas maneiras. Essas relações são muito orgânicas e construídas ao longo do tempo e, mesmo não sendo comum como já disse, há sim estúdios que gostam de saber de cara o seu perfil, mas, pelo que tenho observado, são a minoria. Contudo, acredito que, mais do que para o seu cliente, o seu perfil tradutório tem que estar claro para você, pois, caso chegue uma produção com prazo extremamente curto e de algo que não se enquadra no seu perfil, talvez seja mais sensato recusar.
Há os tradutores que topam qualquer negócio, até porque é uma área que acaba, de certa forma, exigindo isso. Entretanto, não se pode topar algo em condições muito desfavoráveis, pois o risco de se queimar é muito grande e ninguém quer isso, não é mesmo? Afinal, o tradutor não é obrigado a aceitar tudo que lhe mandam, e se ele sentir que não vai conseguir entregar no prazo acordado, o melhor é ser franco consigo e com o cliente e recusar. Nunca se esqueça: é sempre melhor o não verdadeiro do que o sim falso.
Para encerrar, fica o exercício: quais são as áreas de que você mais gosta? Quais são seus temas preferidos? Você tem sites e livros confiáveis mesmo para os assuntos que você já tem um certo domínio? Pense bem nessas perguntas e comece a se preparar desde já para que, quando surgir uma oportunidade, você possa pegá-la e fazer um trabalho de excelência.
Gostou do assunto de hoje? Como sempre, não se esqueça de deixar o seu comentário pra trocarmos uma ideia. Um grande abraço e até o próximo post! 😉
Gizeli
2 de setembro de 2018Olá, Paulo! Sou sua aluna no Brasillis. Adorei o seu “blog”, acompanharei sempre que puder.
Achei interessante esse tópico sobre o perfil do tradutor. Eu, por exemplo, assisto a filmes e séries de ação, terror, suspense, aos que envolvem psicologia criminal, história e biografias.
Porém, como foi dito no artigo, gostar desses gêneros, não implica um total entendimento das falas, o que me apresenta apresenta desvantagens, principalmente naqueles que envolvem história e psicologia criminal. Os filmes de heróis também possuem uma terminologia muito específica, às vezes de difícil compreensão.
Gostaria de saber se você tem alguma dica sobre aonde eu poderia encontrar fontes para essas terminologias que apresentei. Gostaria de começar a entender sobre os temas com os quais me identifico primeiro, para enfim, trabalhar com outros gêneros.
Grande abraço.
Gizeli
Paulo Noriega
21 de setembro de 2018Respondido em aula agora, Gizeli! =) Obrigado pelo prestígio!
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